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sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Para as pessoas com privilégios, com carinho

1º Aviso: esse foi o primeiro texto que tentei fazer inteiramente em linguagem neutra. Não estou certa se consegui.
2º Aviso: eu sei perfeitamente que possuo muitos privilégios também. Esse texto é para mim também.
3º Aviso: todas as imagens são retiradas do tumblr fuckyeahsubversivekawaii, como sempre hahaha. <3  

"Ninguém pediu por sua opinião sexista de merda"
À vocês, queridas pessoas privilegiadas em algum aspecto de suas vidas =^-^=
À vocês, amáveis homens que são brancos e heterossexuais, cisgêneros e de classe média =^-^=
À vocês, adoráveis mulheres brancas, acadêmicas e que "acreditam em Deus" =^-^=
À vocês, belíssimas pessoas que sempre tiveram seus corpos dentro dos padrões =^-^=
À vocês, ternas pessoas que dizem "gostaria de ser surda para não ouvir isso" porque não o são de fato =^-^=
À vocês, todas essas maravilhosas pessoas com privilégios maravilhosos em uma sociedade maravilhosa =^-^=
Segue um recado:

01) Não se atrevam a tentarem definir o que é opressão e o que não é.
02) Não se atrevam a tentarem entender as nossas lutas pela sua régua moral.
03) Não se atrevam a obrigar pessoas a se encaixarem dentro de suas normas estúpidas.
04) Não se atrevam a falar mais alto do que nós nas nossas próprias causas.
05) Não se atrevam a desqualificar os nossos atos de empoderamento individual por quaisquer critério moral que seja.
06) Não se atrevam a considerarem que "está passando dos limites" porque algum ato te ofende.
07) Não se atrevam a ignorar nossas pautas apenas porque está te incomodando.
08) Não se atrevam a ridicularizar nossas causas.
09) Não se atrevam a acharem, por um segundo, que precisamos da sua aprovação para existir.
10) Não se atrevam a pensar que nós permitiremos suas agressões sem uma boa resposta.

Nossa reação pode ou não ser violenta. Nossos atos podem ou não serem agressivos e ofensivos ao status quo. Nossa existência pode ou não ser "discreta". Porém todas essas coisas são decididas por nós, para nós, sobre nós. Você não tem direito ao voto aqui.

Eu me pergunto se vocês estão realmente falando sério quando afirmam que se ofenderam com qualquer reação agressiva nossa, tentando podar nossa raiva e nosso ódio, querendo deslegitimar nossas reinvindicações porque não nos comportamos da maneira que você achou que cabia. Uma surpresa, minhas queridas pessoas: nós sequer nos adequamos nos padrões que vocês consideram adequados, por que nossas práticas seriam consideradas adequadas? Por que a nossa revolta seria padronizada para os seus interesses? Por que precisamos nos preocupar em conquistar a simpatia de vocês se as nossas causas são válidas por si só?

Às vezes as pessoas parecem esquecer que estamos falando de direitos básicos e fundamentais e começam a falar como se estivéssemos em uma negociação de guerra ou algo do gênero. "Ora" vocês nos dizem "você precisa tomar cuidado com essas posturas extremistas para ganhar apoio!" e então vocês olham a gente de cima para baixo e então de baixo para cima, como se pudessem nos avaliar com propriedade. Vocês não tem. A questão é essa: vocês simplesmente não tem aptidão suficiente para tanto. Isso aqui não é uma guerra, é um massacre. Nós não estamos "brigando" em iguais condições, estamos reagindo à opressões milenares. Não existe "exagero na reação" quando direitos estão sendo violados o tempo todo e ninguém faz nada a respeito. Não existe "ser extremisma demais" na libertação.
"SAI DAQUI, SEU CUZÃO" (na minha tradução inteiramente livre ok)
Não se iluda acreditando na sua bondade inerente à quem você é, convencendo a si de que é uma pessoa iluminada que olhará por nós. Esse é o erro que nós, pessoas com algum privilégio, cometemos tão miseravelmente e agredindo tantas pessoas: acreditamos que descer do pedestal é uma tarefa tão árdua que merecemos louros, parabenizações, medalhas de ouro pelo nosso maravilhoso feito. Não merecemos. Descer do pedestal é o mínimo que exigimos de você e atente-se ao exigir, o verbo usado. Não se pede. Se exige seus direitos, se exige igualdade nos direitos perante ao Estado, se adquire libertação perante à sociedade - essa sociedade, que sempre estamos falando dela como uma entidade maligna e suspeita que ninguém quer admitir que faz parte. Eu gostaria de lembrar não apenas à vocês, mas à mim mesma: admitir seus privilégios não te faz uma pessoa perfeita, admitir seus privilégios te faz uma pessoa decente. Todo mundo se sujeita à falhas e incoerências, porém é nosso dever saber recuar quando se deve, pedir desculpas quando se erra, calar-se quando é sábio e falar quando for necessário - que é o tempo todo, basicamente.

Não fale do que não sabe, nobre pessoa com privilégios. Não trate de nossas realidades sem o menor conhecimento ou empatia. Não use a nós como muletas imaginárias dos seus falhos argumentos. Não pense que temos uma assessoria de marketing, porque não somos uma empresa. Não pense que você é indispensável ao movimento, porque não é. Não ache que aprendeu tudo, porque ninguém nunca aprenderá tudo que é possível, especialmente no que se refere aos movimentos sociais e suas classes. Talvez você não goste de todas as negativas em imperativo que eu digo aqui, talvez você se sinta desconfortável, talvez você se incomode. Não pense, contudo, que eu me importo com o seu ego ferido. Eu já disse que você não é indispensável?

É óbvio que desejamos que você nos apóie. É lógico que queremos agregar quantas pessoas ao movimento quanto for possível e ameaçar com a nossa força. Eu nunca expulsaria você de qualquer lugar só por possuir privilégios, mesmo porque todo mundo tem um ou dois privilégios. Mas enquanto o nosso apoio vem também das várias pessoas empáticas ao movimento, a nossa real força sempre vem daquelas que são marginalizadas, discriminadas e ojerizadas. A real força de qualquer movimento nunca vem da gente "simpatizante", gente essa que possui privilégios e empatia o suficiente para saber colocar-se no seu lugar. A força do feminismo não vem na forma dos homens que apoiaram suas esposas e irmãs, mas na forma das mulheres cansadas e oprimidas. A força do movimento racial não surgiu entre as diversas pessoas brancas que concederam em não financiarem mais a escravidão ou algo assim, e sim entre as inúmeras pessoas negras descendentes de escravos, subjugadas e feridas pelo racismo e todas suas consequências. A força da classe oprimida que dá medo. Nós desejaremos que você se alie à nós porque é interessante agregar números, mas não queremos apenas números. Queremos números com propriedade. Queremos que todos os nossos números saibam o que estão fazendo, o que estão defendendo e o papel que devem cumprir nelas.

Saiba disso: nós damos sinceramente todo o nosso apoio à você caso queira se aliar à nós, mas esteja absolutamente ciente de todos os "não" que coloquei aqui. Lembre-se deles. Por que então, você pergunta, você se aliaria sendo que você é dispensável? Por que você resolveria descer do seu pedestal se não ganhará nada com isso? Eu até que entendo seus receios, mas veja bem: o que você ganharia não descendo do seu pedestal? O que você ganharia se mantendo nessa posição de pessoa afundada nos próprios privilégios? O que você ganha com a opressão de outras pessoas? Você tem lucro direto nisso? Você não gostaria de saber que uma única escolha sua pode tornar a vida de outras pessoas mais fáceis e suportáveis? E principalmente: por que você tem que ganhar alguma coisa com descer do pedestal? Não te daremos biscoito na boca por ser decente. Você não pode apenas reconhecer o óbvio em vez de agir tão estupidamente sobre as nossas vidas, até mesmo quando é sem querer?

Eu pensei em dizer "não sinta medo". Mas estaria tão longe do meu objetivo com todos esses textos.
Sinta medo sim.

Há raiva e há amor em todos esses movimentos. E não perdoaremos a quem nos agrediram =^-^=

"Permaneça lutando" <3

6 comentários:

  1. Só trocaria as crases... Basta a preposição "a".

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    1. Você diz em "À xxxx"? Estou confusa. Sempre achei que caso fosse no masculino, seria "ao fulano de tal", então o equivalente seria com crase. Eu não sei, não sou muito boa com crases '-'

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  2. Quando o texto é bom particularmente não me importa o "português politicamente correto". Achei incrível mesmo. Parabéns!

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  3. 1. "Esse é o erro que nós, pessoas com algum privilégio, cometemos tão miseravelmente e agredindo tantas pessoas: acreditamos que descer do pedestal é uma tarefa tão árdua que merecemos louros, parabenizações, medalhas de ouro pelo nosso maravilhoso feito. Não merecemos." - perfeito!!! essa cena é tão comum.. sempre fico extremamente constrangida, mas nunca consegui colocar em palavras.. parabéns! belíssimo texto :)

    2. concordo com a larissa. nada mais chato e desnecessário do q a polícia da gramática.

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    1. 1. Siiiim! Pessoas que são privilegiadas que querem apoiar movimentos sociais podem o fazer e devem fazê-lo, mas devem lembrar de quem são e qual é o seu papel ali. A coisa de, por exemplo, "feminismo é sexy" pra incentivar caras a serem feministas... e então eles se tornam automaticamente lindos e maravilhosos por serem feministas... isso não me agrada.

      E olha que eu sou das que menos se incomoda com homens falando de feminismo.

      2. Aaaaaah, a pessoa só fez uma observação, não foi nada demais rs ^ _ ^

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Se você for amor, tome um chá, sente no sofá, tire uma soneca, fique à vontade que a casa é tua. Se você não for amor, inclusive sendo homofóbico, misógino, transfóbico, racista, etc., eu excluirei sua postagem. Sim, porque aqui é ditadura da minoria e as pessoas que me amam e/ou me lêem não são obrigadas a lerem sua merda. Então pense duas vezes :)